Provocar pânico jamais pode ser considerada uma forma eficaz ou produtiva de educar. Consequentemente, espalhar o medo é a pior forma de falar de sexualidade. Especialmente quando se sabe que o medo acaba se convertendo em pânico. As consequências sempre são danosas.
Não se educa com medo. Educa-se com diálogo. E com informação. Mas não com informação que tenha como resultado gerar medo. Quanto menos medo uma informação passa, mais ela educa. E quanto mais informação existir, menos medo ela vai provocar. Porque o valor da informação é o de prevenir. E não o de assustar.
Espalhar o medo é a pior forma de falar de sexualidade
Essa pode ser uma das lições de um encontro realizado em julho/2019 por iniciativa de grupos religiosos da igreja evangélica, em São Paulo. A chamada ExpoErótica começou a provocar polêmicas logo ao ser montada.
A pretexto de abordar temas como sexualidade e infecções sexualmente transmissíveis, seus organizadores espalharam cartazes que remetiam ao medo. Como o de uma caveira com a frase “A AIDS MATA! Pior ainda: associavam a imagem dos infectados pela AIDS a suicidas.
Imediatamente, ativistas dos movimentos de prevenção da AIDS e profissionais de saúde começaram a reagir. Segundo o noticiário, eles entraram em contato com os organizadores, e os cartazes mais alarmistas acabaram sendo retirados. Mas o mais importante é a lição que o evento deixou.
Espalhar o medo não significa respeito
Muitos pais confundem respeito com medo. Uma criança tem que respeitar os pais pelo que os pais representam e não pelo medo. A crença de que pancada educa nasce desse equívoco da suposta eficácia baseada em violência. Filhos que respeitam os pais nunca apanham. E filhos que apanham ficam com medo. Mas o medo não educa. Pode até apavorar. Ou paralisar.
Isso vale também para a sexualidade. E para qualquer iniciativa que se pretenda educativa. O que leva a uma sexualidade sadia é a conscientização baseada na informação e não no medo. E o pior medo é aquele provocado pelas crenças e pelos dogmas. São métodos que limitam; não educam. E que, muito frequentemente, pretendem sufocar ou deturpar o sentido do prazer.
Espalhar o medo é reprimir o prazer
Numa sociedade que se diz moderna, mas que, na realidade, ainda é muito conservadora, medo, pânico, crenças e dogmas reforçam ainda mais os preconceitos. E preconceito é sobretudo o resultado da desinformação ou de conceitos deturpados.
Não podemos discutir aqui o conceito de felicidade, pois ele pode variar de pessoa para pessoa. Mas é impossível entender que, numa ação que não prejudica ninguém, a felicidade possa ser alcançada com a supressão da sensação de prazer.
Sua escolha sem imposições
A religião evangélica prega a ideia de que a relação sexual somente pode ocorrer depois do casamento. E é justamente essa ideia que prevalece na denominação do movimento que deu origem à exposição, que se intitula Eu Escolhi Esperar.
Mas uma relação sexual antes do casamento somente se torna imprópria, ou mesmo criminosa, no caso em que, observados os preceitos legais quanto à idade, essa relação não é consentida ou não é desejada por ambas as pessoas envolvidas.
Como fica a felicidade?
Se a relação ocorre com menores de idade, é crime tipificado em lei. Se ocorre entre maiores de idade, e é consentido mutuamente, não há crime. Nesse caso, se ambos desejam, devem suprimir o prazer, na visão dos evangélicos, e não realizá-la. Podem estar suprimindo também a sensação de felicidade? Certamente. Então as crenças e dogmas estão acima da sensação de felicidade?
Se a resposta para você é sim, você está dizendo que as crenças e dogmas são mais importantes do que a sua felicidade. Ou, consequentemente, que crenças e dogmas têm esse direito sobre você. Tudo bem. Desde que você encare isso como uma opção sua. E não tente impô-la a ninguém.
Pecado é invenção repressora
Certamente os religiosos fanatizados pelo conceito de pecado vão me atirar pedras. E até me acusarem de estar pregando o pecado. Mas, se eu não pratico nenhuma religião, ou pratico uma religião que não condena sexo antes do casamento, certamente eu não vou entender como certa essa noção de pecado. Noção essa que – queiram ou não certas religiões – reprime o prazer. E um prazer, repetimos, só é indigno ou deve ser reprimido quando causa prejuízo ao outro ou é tipificado como criminoso.
As religiões tentam justificar crenças e dogmas com base em preceitos bíblicos. Mas é bom lembrar que, se a Bíblia atualmente já atinge mais de três mil traduções, imagine-se o número de interpretações. É preciso ter em mente, ainda, que espalhar o medo é a pior forma de falar de sexualidade. E muitas pessoas usam até a Bíblia para espalhar o medo.
Bíblia e interpretações: espalhar o medo?
Qualquer escritor, produtor cultural, editor ou tradutor sabe que não existe tradução perfeita, nem a partir do idioma original. Deduza-se, portanto, como exagero ou, no mínimo, imprecisão considerá-la como a palavra de Deus.
Novamente os fanáticos irão se revoltar, mas essas não são minhas simples conclusões. São fatos incontestáveis. Por todos esses motivos, é inevitável a conclusão de que exposições sobre sexualidade, como a que mencionamos logo no início, devem ter como base a ciência, as leis e o bom-senso. Sem jamais querer impor visões de religiões. E muito menos o medo.
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